De quem é a culpa

Enquanto estou atendendo casais em crise, há momentos em que me lembro de minha época de escola, quando a professora reprimia algum aluno por estar conversando durante a aula, e ele respondia: “Mas foi ele quem começou!” Com os casais funciona mais ou menos assim. É a mesma lógica, mas o cenário é outro: meu consultório e um casal trocando acusações. Eu, no meio do tumulto, hora ou outra, ouço uma apelação de um dos dois para que eu me posicione. Eles clamam pelo reconhecimento de quem tem a razão. Estão imersos no raciocínio dicotômico de que estão certos e o outro, portanto, errado. Enxergam-me como juíza, para apontar quem está correto.

Sou graduada em psicologia, não em direito. Minha formação não me leva a adotar este tipo de postura. Prefiro olhar mais para a interação dos envolvidos que o enredo das discussões em si. Nos exemplo dos alunos conversando e do casal brigando, temos duas pessoas interagindo. Por isso, afirmo que cada um tem participação na autoria tanto da conversa como da briga. Porém, reconhecer isso é raro.

É sobre esta capacidade de responsabilização que procuro trabalhar. Em geral, vejo casais que têm na ponta da língua o que o outro faz de errado e o torna culpado por determinado evento. Isto não é útil ao meu trabalho. Como falei anteriormente, não sou advogada, logo, não vou defender nem julgar os cônjuges. Também não é assim, culpabilizando, que uma briga é desfeita. Para a reconciliação de fato acontecer, é preciso que cada um olhe para si e perceba o que pode fazer diferente. Nós não temos controle sobre o outro, mas temos, sim, sobre nossos atos. Como as relações são sistêmicas, ao mudar nosso posicionamento e atitudes em relação ao outro, há chances reais dele também se reposicionar. Essa é a solução. Na verdade, ter razão, em situações assim, é o que menos importa...

helena cardoso